São Paulo no horário de pico, avenidas e marginais paradas, e eu pensando no velho slogan de adesivo: “I’d rather be riding” – preferiria estar montando. No rádio, começa a agridoce canção: “Meu amor, o que você faria se só lhe restasse esse dia?”
Olhando luzes de retrovisor, pedestres apressados, céu de entardecer numa cidade que nunca dorme, fiquei ponderando as opções oferecidas pelo cantor – passear no shopping center, esperar o telefone tocar? Mas eu já sabia que, confirmado o armagedon iminente, para mim só haveria uma coisa a fazer. Chamar os amigos, encilhar os cavalos, e sair estrada afora num passeio sem pressa. Olhar paisagens conhecidas como se fosse pela primeira vez, descobrir trilhas e atalhos novos sem nos preocuparmos se eles levam ou não a algum lugar. Deixar os cavalos escolherem seu próprio ritmo, um galopinho retranqueado na areia, passo cauteloso em descidas enlameadas, permitindo que belisquem aquele capim à beira do caminho. Desafiarmo-nos uns aos outros para entrar num curso d’água, rir dos respingos e do eventual banho forçado. Lá pelo meio da manhã, fazer rodar o frasquinho conhecido por “estojo 12 anos de primeiros socorros”, apenas um dedal para cada um, só para fazer tipo e esquentar o sangue. Não nos irritarmos com o potro assustado nem com o cavalo fora de forma, prosseguindo neste passeio de maneira descompromissada com as expectativas cotidianas de “trabalhar o cavalo”. Usar o telefone celular para provocar os amigos ocupados e estressados alhures (nos escritórios? No carro? No advogado? Na igreja? O que cada um faria neste último dia?), dizendo coisas do tipo “adivinha onde estamos? Você está fazendo falta, devia ter vindo com a gente”. Parar nos barzinhos mais improváveis, onde os lanches disponíveis são tubaína e doce de amendoim, ou bolinho de frango com caldo de cana, respondendo perguntas curiosas de crianças e velhos sobre os cavalos, sobre as tralhas que usamos. Admirar éguas e potros, boiadas e lavouras, nas fazendas por onde passamos, cumprimentar carroceiros, ciclistas e velhos tropeiros que passam por nós. No caminho de casa, relembrar histórias de cavalgadas passadas, de tombos memoráveis e cavalos inesquecíveis, de companheiros que partiram para outros países ou outros mundos, daquele primeiro cavalo da infância que vive eterno em nossos corações, e como quem nunca haverá igual. E ao fim da tarde, uns assam uma carninha que ficará maravilhosa nem que preta por fora e crua por dentro, outros temperam caipirinhas e saladas. O violeiro toca ao vivo ou no CD, os cavalos descansam pastando e espojando-se no piquete ao lado, e, por apenas alguns minutos, o amanhã não importa.
Enquanto o trânsito melhorava aos poucos, e a música que tinha desencadeado minha cavalgada imaginária entrava nos últimos acordes, dei-me conta de um detalhe surpreendente: não era preciso que o mundo, de fato, acabasse amanhã para que tudo aquilo pudesse acontecer. Bastava chamar a turma, arrear os cavalos, e ir. Todos os dias não, pois vai que o mundo não acabe, afinal precisamos trabalhar, sustentar a família de gente e bichos, cavalos inclusive. Mas uma vez por mês, simplesmente assim, sem grandes preparativos, sem justificativa salvo o prazer que nos trazem os amigos, gente e cavalos, enquanto ainda nos temos uns aos outros.
Olhando luzes de retrovisor, pedestres apressados, céu de entardecer numa cidade que nunca dorme, fiquei ponderando as opções oferecidas pelo cantor – passear no shopping center, esperar o telefone tocar? Mas eu já sabia que, confirmado o armagedon iminente, para mim só haveria uma coisa a fazer. Chamar os amigos, encilhar os cavalos, e sair estrada afora num passeio sem pressa. Olhar paisagens conhecidas como se fosse pela primeira vez, descobrir trilhas e atalhos novos sem nos preocuparmos se eles levam ou não a algum lugar. Deixar os cavalos escolherem seu próprio ritmo, um galopinho retranqueado na areia, passo cauteloso em descidas enlameadas, permitindo que belisquem aquele capim à beira do caminho. Desafiarmo-nos uns aos outros para entrar num curso d’água, rir dos respingos e do eventual banho forçado. Lá pelo meio da manhã, fazer rodar o frasquinho conhecido por “estojo 12 anos de primeiros socorros”, apenas um dedal para cada um, só para fazer tipo e esquentar o sangue. Não nos irritarmos com o potro assustado nem com o cavalo fora de forma, prosseguindo neste passeio de maneira descompromissada com as expectativas cotidianas de “trabalhar o cavalo”. Usar o telefone celular para provocar os amigos ocupados e estressados alhures (nos escritórios? No carro? No advogado? Na igreja? O que cada um faria neste último dia?), dizendo coisas do tipo “adivinha onde estamos? Você está fazendo falta, devia ter vindo com a gente”. Parar nos barzinhos mais improváveis, onde os lanches disponíveis são tubaína e doce de amendoim, ou bolinho de frango com caldo de cana, respondendo perguntas curiosas de crianças e velhos sobre os cavalos, sobre as tralhas que usamos. Admirar éguas e potros, boiadas e lavouras, nas fazendas por onde passamos, cumprimentar carroceiros, ciclistas e velhos tropeiros que passam por nós. No caminho de casa, relembrar histórias de cavalgadas passadas, de tombos memoráveis e cavalos inesquecíveis, de companheiros que partiram para outros países ou outros mundos, daquele primeiro cavalo da infância que vive eterno em nossos corações, e como quem nunca haverá igual. E ao fim da tarde, uns assam uma carninha que ficará maravilhosa nem que preta por fora e crua por dentro, outros temperam caipirinhas e saladas. O violeiro toca ao vivo ou no CD, os cavalos descansam pastando e espojando-se no piquete ao lado, e, por apenas alguns minutos, o amanhã não importa.
Enquanto o trânsito melhorava aos poucos, e a música que tinha desencadeado minha cavalgada imaginária entrava nos últimos acordes, dei-me conta de um detalhe surpreendente: não era preciso que o mundo, de fato, acabasse amanhã para que tudo aquilo pudesse acontecer. Bastava chamar a turma, arrear os cavalos, e ir. Todos os dias não, pois vai que o mundo não acabe, afinal precisamos trabalhar, sustentar a família de gente e bichos, cavalos inclusive. Mas uma vez por mês, simplesmente assim, sem grandes preparativos, sem justificativa salvo o prazer que nos trazem os amigos, gente e cavalos, enquanto ainda nos temos uns aos outros.
Foto: autoria e copyright de Paula da Silva. Foi tirada em maio de 2006, no Rio do Rastro, SC (sim´, é no Brasil). Para mais imagens da Paula, vejam em http://www.pauladasilva.com/
Texto: Claúdia do Blog Cavalo Entusiasmados http://leschonski.blog.terra.com.br/
Oi Rodrigo,
ResponderExcluirparabéns pelo blog, está muito bonito; vou colocar um link nos Cavalos Entusiasmados. Apenas uma sugestão: seria legal que no seu blog aparecesse a autoria do texto, não apenas o link para a origem do mesmo. Mesmo porque vários leitores não vão ligar uma coisa à outra. É um praxe simples dos direitos autorais, tanto em textos acadêmicos quanto referências literárias... :)
A mesma coisa vale para a autoria da foto, que está identificada na sua fonte, e aqui apareceu anônima... Mesmo porque minha amiga, a fotógrafa Paula da Silva, não gosta nadinha quando é publicada uma foto dela sem os devidos créditos...
Muito obrigada pelas providências, e aguarde minha visita em Monteiro Lobato!
Abraços,
Claudia